Discos Marcus Pereira – Uma gravadora que mapeou e eternizou a música popular e regional.
“Uma fotografia aérea musical do Brasil”. É assim que Marcus Pereira, um ex publicitário com formação em direito, definiu um dos projetos musicais mais ambiciosos de nosso país.
Durante a década de 60 dois amigos, um deles músico e outro publicitário, fundaram o bar “O Jogral” na cidade de São Paulo. Eram Luis Carlos Paraná e Marcus Pereira.
O bar era referido por alguns como um “mini-templo da cultura brasileira”. Por lá passavam jornalista, intelectuais e artistas que se reuniam para ouvir aquilo que consideravam como a verdadeira música popular brasileira. Era tudo que contrastava ao iê-iê-iê da época, e os entusiastas da Jovem Guarda.
Marcus Pereira convivia entre músicos e artistas, e apesar de não compor, tocar instrumentos, ou até mesmo cantar, ele se via cada vez mais dominado pelo mundo musical, e ia encontrando maneiras de satisfazer essas suas paixões e vontades.
Inicialmente, Marcus presenteava seus clientes todos os finais de ano com discos produzidos por ele mesmo. Apesar de modesto, faziam muito sucesso e despertavam curiosidades. No começo da década de 70, Pereira dá um novo rumo para sua vida, deixa a publicidade e passa a se dedicar ao projeto que o transformaria em um dos personagens mais importantes dentro da música brasileira.
Anos mais tarde, Marcus explica o abandono da publicidade: “É difícil gostar de ser cúmplice de interesses que vivem de estimular, ao delírio, o consumo numa sociedade onde apenas uma minoria tem condições de consumir”.
Essa sua declaração ilustra também seu desejo de trabalhar com música popular e folclórica, algo que sempre esteve fora do circuito fonográfico e, de certa fora, marginalizada. E foi assim que, em 1973, Marcus lança sua própria gravadora, uma das precursoras na busca da “independência” fonográfica no Brasil.
Seu primeiro projeto foi “Mapa Musical do Brasil”, que nasceu logo após a fundação da gravadora. Com uma equipe coordenada por Hermilo Borba Filho, os pesquisadores saíram por todas as regiões do país fazendo registros “in loco” de diversas formas musicais e folclóricas. Esse primeiro material recolhido foi dividido em séries de quatro álbuns: “Música Popular do Sul”, “Música Popular do Nordeste”, “Música Popular do Centro-Oeste” e “Música Popular do Norte”.
Apesar da variedade de gravações, havia uma fórmula balanceada que identifica toda essa coleção: os registros folclóricos “ao vivo” são intercalados por interpretações de grandes nomes da MPB. Um exemplo é o volume “Música Popular do Sul”, que tem como destaque Elis Regina cantando sambas arranjados pelo maestro Rogério Duprat.
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Porém, um dos pontos altos desse disco disco é a sanfona do gaúcho Moisé Mondadori, com 81 anos na época da gravação, tocando a polquinha “Boi Barroso”. Algo semelhante se repete no álbum “Música Popular do Nordeste”, que incluiu o Quinteto Violado, mas teve seu momento mais brilhante no alucinado desafio dos repentistas Severino Pinto e Lourival Batista.
Marcus Pereira foi um sonhador, um visionário, e também um homem de coragem. E foi essa coragem que nos possibilita hoje ouvir discos de Cartola, por exemplo. Um nome que já era cantado por outros, mas que ainda não possuía um disco próprio.
Angenor de Oliveira, o Cartola, que também é um dos fundadores da Escola de Samba Mangueira, foi chamado pela Discos Marcus Pereira para gravar seu primeiro álbum aos 66 anos de idade. Naquele momento, ele trabalhava como lavador de carros. Foram dois discos, o primeiro lançado em 1974, e o segundo em 1976. Este último, inclusive, ocupa a 8ª posição na lista d’Os 100 maiores discos da música brasileira da Rolling Stone.
A gravadora Discos Marcus Pereira lançou nomes que iam de Cartola à Banda de Pífanos de Caruaru, de Ernesto Nazareth a Paulo Vanzolini, do Quinteto Armorial a Elomar. Foi uma gravadora que abriu espaço para compositores e intérpretes que transbordavam em criatividade, mas encontravam pouco espaço no meio fonográfico.
Marcus Pereira alcançou feitos incríveis, só no ano de 1974 lançou mais de 20 discos. Não é a tona que a empresa Discos Marcus Pereira levava seu nome, pois ela vivia e funcionava em função de seus humores e sonhos. Sonhos estes que renderam 144 gravações em uma década!
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